LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A Polícia Federal investiga a suspeita de que o filho mais velho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tenha simulado uma operação de comércio exterior para remeter ilegalmente recursos para fora do país. Esse artifício é usado por doleiros de São Paulo e investigado pela Polícia Civil e pela Receita Federal no Estado.
A PF e o Ministério Público Federal, num desdobramento da Operação Faktor (ex-Boi Barrica), rastreiam contas do empresário Fernando Sarney em diversos cantos do mundo.
No decorrer desse trabalho, os investigadores se depararam com a chamada "conexão chinesa", empregada por doleiros e, segundo investigadores do caso, possivelmente adotada também por Fernando.
O esquema consiste na utilização de empresas fantasmas registradas em nome de laranjas para simular transações de compra e venda com a China, dando aspecto de legalidade a operações de evasão de divisas.
Na primeira etapa, a empresa fictícia no Brasil fecha a importação de produtos chineses. O contrato de câmbio é então devidamente registrado no Banco Central. Depois, os dólares são enviados para uma conta na China em nome do exportador.
A partir daí a fraude se torna visível. A mercadoria comprada nunca chega ao Brasil. Os policiais e os auditores vão atrás dos "donos" das importadoras. No lugar de empresários bem-sucedidos, encontram pessoas humildes que tiveram seus nomes usados indevidamente.
A essa altura, o dinheiro depositado na China provavelmente já foi transferido para algum paraíso fiscal europeu ou caribenho. As empresas chinesas também são de fachada.
Conforme a Folha revelou em 2009, a investigação dos policiais e fiscais paulistas identificou um grupo de 40 empresas que usou esse mecanismo para enviar ao menos US$ 800 milhões, entre 2005 e 2008, para o exterior.
No início de 2008, Fernando Sarney fez uma operação semelhante a esse esquema. O dinheiro transferido, porém, já estava no exterior. De uma conta em nome de "offshore" nas Bahamas, ele remeteu US$ 1 milhão para uma agência do HSBC em Qingdao, na China.
A beneficiária dos recursos é a Prestige Cycle Parts & Accessories Limited -pelo nome, seria uma empresa de peças e acessórios de bicicletas ou motocicletas. Não é de conhecimento público que Fernando Sarney ou sua família tenham negócios nessa área.
Essa não foi a única transação financeira no exterior realizada pessoalmente pelo filho do presidente do Senado e rastreada pelos investigadores brasileiros. Conforme a Folha revelou ontem, o governo suíço, a pedido da Justiça Federal brasileira, bloqueou uma conta controlada exclusivamente por Fernando, com depósitos de US$ 13 milhões.
As autoridades daquele país detectaram uma tentativa de Fernando de transferir recursos para o Principado de Liechtstentein, conhecido paraíso fiscal europeu.
Na Operação Faktor, a PF interceptou, com autorização judicial, diversos e-mails de Fernando, seus familiares e amigos tratando de operações financeiras no exterior.
Numa das mensagens, sua mulher, Teresa Sarney, informa a uma pessoa chamada Zeca (não identificado) uma conta numerada no banco americano Wells Fargo, para o "depósito de mil dólares".
E-mails para banco foram monitorados
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A Polícia Federal interceptou e-mails trocados por pessoas próximas a Fernando Sarney nos quais são informadas transações financeiras no exterior a partir de uma conta no banco Credit Suisse.
As mensagens eletrônicas foram monitoradas pela PF com autorização judicial. Em três delas, o remetente é um funcionário do Credit Suisse em Nassau (Bahamas), identificado como "gestor de grandes fortunas".
Os e-mails são enviados ao empresário Gianfranco Perasso. Segundo a PF, Fernando contava com a ajuda de Perasso para operar contas no exterior em seu nome. Os dois são amigos desde que cursaram engenharia na USP.
Em mensagem de 2 de abril de 2008, com o título "remessa", o funcionário do banco diz que a "execução do pagamento foi correta" e que o beneficiário é a "Kalasia International", provavelmente uma "offshore" nas Bahamas.
Em outro e-mail do dia 7 de abril, Perasso também trata de depósito. "Meu correspondente afirma que não houve o depósito", diz ele. "Estou solicitando o retorno dos fundos imediatamente", responde o funcionário do banco.
Não há contas no exterior declaradas à Receita em nome do empresário, da mulher dele, Teresa Sarney, e de Perasso.
outro lado
Empresário e advogado não falam sobre o caso
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O empresário Fernando Sarney não respondeu ao pedido da Folha para que comentasse a suspeita da PF de que simulou uma operação de comércio exterior para remeter ilegalmente recursos ao exterior.
Procurado, seu advogado, Eduardo Ferrão, não ligou de volta. Fernando tem se recusado a falar sobre assuntos que envolvam a Operação Faktor, por considerar que é uma investigação sigilosa e que seu vazamento é "criminoso".
A mesma atitude foi adotada quando ele foi questionado anteontem sobre o bloqueio de uma conta sua pelo governo suíço. O empresário afirmou que não iria se manifestar "sobre o que não conhece".
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), pai de Fernando, tem dito que o assunto não lhe diz respeito e que cabe a seu filho e ao advogado dele comentarem o assunto.
O empresário Gianfranco Perasso não foi localizado para comentar a troca de e-mails com o banco Credit Suisse.
O banco Credit informou que não iria se manifestar.