Favela da Liberdade Em São Luís: o retoro da miséria perpetuado |
Em quase cinco décadas de domínio, Sarney pouco fez para livrar o Maranhão da pobreza
LEONARDO COUTINHO
“A terminação “istão”, em algumas das
línguas faladas na Ásia Central, significa “lugar de morada” ou
“território”. Assim, o Quirguistão é o lugar de morada dos quirguizes. O
Cazaquistão, o território dos cazaques, e o Tadjiquistão, dos
tadjiques. Também por esse motivo, o estado do Maranhão – tão miserável
quanto as antigas repúblicas da extinta União Soviética e igualmente
terminado em “ão” – poderia muito bem ser rebatizado de Sarneyquistão.
Há 46 anos, o presidente do Senado, José
Sarney (PMDB-AP), ao lado de sua família e apaniguados, comanda o
estado que, segundo o Censo 2010, abriga 32 dos cinqüenta municípios
mais miseráveis do país.
Quando Sarney chegou pela primeira vez
ao poder, no longínquo ano de 1965, o Maranhão ocupava as últimas
posições do ranking nacional de desenvolvimento. A partir de então, seu
grupo venceu dez eleições para governador, chefiou o Executivo local por
41 anos e… conseguiu o feito de nada mudar.
O “Sarneyquístão” continua ostentando os
indicadores sociais mais vexatórios do país, comparáveis aos das nações
mais desvalidas do planeta (veja o quadro). Um estudo do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) concluído há duas semanas mostra que a
pobreza extrema atinge 14% da população. Em 82 das cidades do estado, a
renda média é inferior ao que o Bolsa Família paga em benefícios.
Outro estudo afirma que 78% dos
maranhenses dependem de algum programa oficial de transferência de
renda. E não foi a natureza que condenou os maranhenses à miséria.
O estado foi um dos mais prósperos do
Brasil até o século XIX. Tem uma localização estratégica, mais próximo
dos países ricos do Hemisfério Norte, e terras férteis (que só
recentemente, com o cultivo da soja, passaram a ser devidamente
exploradas). Seus habitantes vivem no atraso por outras razões.
O historiador Wagner Cabral da Costa, da
Universidade Federal do Maranhão, identifica três delas. Nos anos 60, o
governo estadual distribuiu grandes extensões de terra a empresas
privadas, com a justificativa de assim desenvolver a economia local. A
conseqüência foi a formação de latifúndios improdutivos que, utilizados
para atividades altamente subsidiadas, como a exploração de madeira e
pecuária, resultaram em quase nenhum retorno financeiro para a economia
maranhense.
O autor da medida? Ele mesmo, José
Sarney. Pautados pelo menos duvidosos critérios que não necessariamente
os do interesse público, seus sucessores deram continuidade ao erro,
esvaziando os cofres do estado para levar para lá indústrias que
demandavam pouca mão de obra. Resultado: metade da população
economicamente ativa hoje depende da pequena agricultura.
Segundo o historiador, a terceira razão
do atraso é a corrupção. “No Maranhão, ela é endêmica”, diz Cabral da
Costa. “A rigor, a República nunca chegou por aqui.”
Em quase cinco décadas, Sarney só perdeu
o domínio sobre o seu Sarneyquistão uma vez. Em 2006, Jackson Lago
(PDT) derrotou sua filha e herdeira política, Roseana, que concorria ao
terceiro mandato de governadora. Mas foi apenas um hiato na história. Em
2009, Lago teve o mandato cassado por compra de votos. Morreu há três
meses, não sem antes ver seu adversário ressurgir das cinzas com uma
aliança inusitada. Com apoio do ex-presidente Lula, Sarney engajou o PT
no projeto de perpetuação de seu clã, conseguiu mais um mandato para
Roseana e indicou os titulares dos principais órgãos federais do estado.
Lá, a aliança dos dois antigos inimigos foi batizada de “sarnopetismo”.
O Maranhão não merecia mais essa praga.
De VEJA
2 comentários:
QUE TRISTEZA!
que pais é este????
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