13 de fev. de 2011

Quando uma marca estreita

Paulo Cezar Rosa   
Não gostei da marca do governo Dilma Rousseff. Também não gostei muito do slogan. Mas o símbolo mais negativo é a marca. Conservadora, fria, sisuda. Mais parece uma marca tucana. Fui pesquisar na rede e encontrei a assinatura eletrônica. Ela diz tudo. Parte da marca anterior, mas em minha opinião, ao invés de avançar, retrocede. Volta para a ideia de um país verde e amarelo, sem espaço para a sua multiplicidade e diversidade. Impõe uma “uniformidade” que não tem como prosperar num país como o nosso.
    Segundo o comunicado divulgado pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom), a marca é uma evolução da marca anterior criada por Duda Mendonça e “traduz a prioridade do governo federal com a erradicação da miséria e redução da pobreza extrema”. A criação da marca, conforme o Meio e Mensagem, é de Marcelo Kertész, VP de criação da Africa, uma das agências de Nizan Guanaes. A responsabilidade, de qualquer modo, seria de João Santana, responsável pelo marketing da campanha eleitoral de Dilma. Kertész, segundo a Secom, não recebeu cachê e teria doado os direitos de uso da marca ao novo governo.
    Há oito anos, lembro de ter me surpreendido com a marca do governo Lula. Achei genial pela simplicidade e multiplicidade de leituras. Se você quiser uma síntese dos oito anos do governo Lula, é só pegar a marca. “Brasil, um país de todos” explica e sintetiza todos os movimentos políticos, econômicos e sociais realizados.
A minha surpresa agora com a marca de Dilma é o inverso. Ela estreita e aprisiona seu governo numa única meta. Fazer do Brasil um país de classe média, erradicar a miséria, é necessário. É um objetivo com o a qual estou de pleno acordo. Mas me parece um erro colocar este objetivo como a marca de todo um governo. Até porque para acabar com a miséria é preciso mudar muita coisa nesse país. É preciso garantir desenvolvimento, crescimento, oportunidades…
No início do governo Lula, foi cometido um erro com a ofensiva do Programa Fome Zero. Parecia que o governo Lula iria colocar todas as suas energias neste único programa. Durou pouco. O programa acabou absorvido pelo Bolsa Família e a marca Fome Zero esquecida no baú dos espalhafatos publicitários.
Claro. A estreiteza da marca não vai inviabilizar o governo Dilma. Mas tem um problema: o diabo mora nos detalhes.
Da Carta Capital

Nenzim vai gastar quase um milhão com carnaval promovido pela Musical Reprise

    Nem bem se livrou da cadeia o prefeito de Barra do Corda, Manoel Mariano "Nenzim" (ainda no PV), já da sinais de que está se lixando para PF e companhia. Pelos fortes indícios apresentados Nenzim, pai do deputado Rigo Teles, mostra intenção de dar continuidade às práticas que motivaram seu pedido de prisão.
    Ao custo de R$ 950 mil, a prefeitura de Barra do Corda está contratando, com dispensa de licitação, nove bandas musicais junto à Musical Reprise Ltda para promover a festa em terras cordinas no período de Momo.
    Na semana passada Nenzim e sua esposa, Santinha, ficaram omiziados durante alguns dias, enquanto aguardavam o socorro vindo do senador Sarney para livrar o prefeito de ver o sol quadrado. A PF bem disse que procurou, mas não achou o sujeito em lugar nenhum. Meteram até a Interpol pelo meio e, nada. O casal parece ter se hospedado em alguma casa mal assombrada.
    Para se resguardar de algum espírito de porco ou bebum corajoso, Nenzim mandou confeccionar 25 camarotes para os quais pretende destinar seus convidados especiais: aqueles que foram parar no xilindró por ter desviado R$ 50 milhões dos cofres da prefeitura municipal de Barra do Corda e seus laranjas.
    Três dias antes da deflagração da Operação Artiages, no dia 3 de fevereiro, que prendeu parte da família Teles e comparsas laranjas o edital estava prontinho para justificar o gasto. Agora, se sentindo livre como um passarinho na mata da Barra, Nenzim volta à carga.
    Taí, dá habeas corpus pro homem que ele faz um carnaval.

Atente para data do edital publicado neste domingo, 14 de fevereiro


Um fazedor de espantos

Ferreira Gullar
QUANDO ESCREVI, na crônica anterior, que mal suportara a notícia da morte de Dias Gomes, numa noite de 1999, jamais imaginaria que outra notícia igualmente doída me atingiria poucos dias depois: a morte de Reynaldo Jardim num hospital de Brasília. Mas não vou falar aqui dessa dor, e sim da pessoa que ele foi, ousada, criativa e, particularmente, em paz com a vida.
    Creio que não ocorreria a ninguém, normal, propor-se reformular um suplemento feminino de um jornal que era, na verdade, um boletim de anúncios classificados. Mas ele o fez: foi à sede do "Jornal do Brasil", que era ali na avenida Rio Branco, pediu para falar com a condessa Pereira Carneiro, dona do jornal, e fez a ela a proposta. Aceita, pôs mãos à obra, começando por publicar um molde de vestido em cada número do suplemento.
    Em breve, acrescentava entre as matérias comuns um conto, um poema, criando, assim, uma seção literária. Dessa seção nasceria o "Suplemento Dominical" do "Jornal do Brasil". Isso foi em 1956. Teve então a ideia de manter, nele, uma página de artes plásticas, uma de poesia e outra de ficção: a de poesia foi entregue a Mário Faustino por indicação de Oliveira Bastos, paraense como ele, e que também me indicou, amigos que éramos, de morar junto.
    A ideia inicial era fazermos, os dois, a tal página, mas terminei assumindo o encargo sozinho. Ninguém ignora o papel que o "SDJB" teve na vida cultural brasileira daquela época, tornando-se o veículo da poesia concreta e, em seguida, do movimento neoconcreto.
    Reynaldo, poeta que era e de muita qualidade, engajou-se, comigo, nos dois movimentos, mas a sua contribuição mais criativa se deu durante o movimento neoconcreto. Como, no fim de 1958, fui demitido do "JB", onde ocupava o cargo de chefe do copidesque, passei a colaborar, graças à conivência de Reynaldo, clandestinamente, no "SDJB". Pouco mais tarde, com a mudança ocorrida no direção do jornal, a condessa me mandou chamar de volta, mas preferi, em vez de retornar à Redação, ficar trabalhando com Reynaldo, como uma espécie de secretário do suplemento.
    Isso coincidiu com o surgimento do movimento neoconcreto (começos de 1959), cujo manifesto foi publicado em edição especial numa primeira página, desenhada por Amilcar de Castro, que se tornou um exemplo de inovação gráfica, bela e audaciosa.
    O "SDJB" fervia de novas ideias no campo das artes e da poesia, que, por sua vez, confundia-se com a expressão visual e plástica. Nasceram os livros-poema, os poemas espaciais, o "poema enterrado", os "bichos" de Lygia Clark e os "labirintos" de Hélio Oiticica. Formávamos uma patota que vivia a inventar coisas, propor coisas, discuti-las.
    Os livros-poema nos levaram a bolar o "livro universo", que nunca realizamos mas daria origem ao "livro da criação", de Lygia Pape, e ao "livro infinito", inventado por Reynaldo e que nada deveu à nossa proposta original: era um livro com duas lombadas, tornando possível, ao chegar-se ao fim do primeiro "volume", prosseguir na leitura do segundo e assim, ao final deste, recomeçá-la. Inventou-o, realizou-o e o deixou de lado, pois já então o que lhe interessava era o "balé neoconcreto", que bolou com Lygia Pape: um balé sem bailarinos, apenas duas placas retangulares, coloridas, que se moviam no palco. Feito isso, foi em frente, pois era tão criativo que não conseguia deter-se no que acabara de criar.
    Os anos se passaram, o Brasil mudou, o mundo mudou, nós mudamos. Reynaldo se mudou do Rio para Curitiba e depois para Brasília, onde desenvolveu intensa atividade como jornalista, realizador e estimulador de várias iniciativas culturais. E se manteve o poeta e o artista inovador que sempre foi.
    No ano passado publicou um livro surpreendente, a começar pelo título: "Sangradas Escrituras". Um volume grande, pesado, de capa dura e sobrecapa em que reuniu seus poemas e muitas outras invenções, em que se misturam versos, desenhos, figuras inusitadas, experimentos poéticos e gráficos perturbadores e fascinantes. O verdadeiro "livro infinito"? Inesgotável, nos arrasta a seu abismo encantatório, do qual talvez não consigamos voltar. Quanto a Reynaldo, é ali que o encontraremos a partir de agora.

O Egito é a Bahia

Caetano Veloso
Carlinhos Brown cantando “... e o Egito é a Bahia” em frente à catedral de Guadalajara, com a multidão mexicana na mão, lançou uma luz inesperada sobre as imagens do Cairo que passáramos a tarde vendo na TV. A frase é de “Sou faraó”, canção sua que é sucesso eterno e irresistível do carnaval de Salvador. Um cara com boa cara de jalisciense (de gente de Jalisco) vence cotovelos para me dar um exemplar usado da edição conjunta de “Pedro Paramo” e “Llano en llamas”, de Juan Rulfo. Esperava a hora de ler Rulfo: ganhar um livro assim, velho, sujo, impregnado de vida mexicana foi a senha. Começo a ler logo que acabe “Los detectives salvages”, de Bolaño, mexicano por adoção.
    Desde talvez novembro do ano passado que eu não via ou falava com Gil. A secretaria de Cultura de Guadalajara nos pôs frente a frente no aeroporto Tom Jobim (o pior do Brasil, que os tem tão maus). Escrevi tantas vezes aqui sobre questões ligadas à sua gestão como ministro, sem sequer procurá-lo para comentar, que esse encontro não combinado por nós me deixou um tanto nervoso. Já contei que não vinha falando com os internetetes ultimamente. Mas Joyce talvez ache difícil de crer que não troquei uma só palavra com Gil durante todo esse tempo. Mas foi assim. Falei com Hermano Vianna (laconicamente e por e-mail) depois que alguns dos meus provocativos artigos já tinham sido publicados (na verdade, depois do último, em que zoei os fãs da web). Com Gil, nem isso. Como quando estive em desacordo com planos do seu ministério, também desta vez consegui ser claro em assumir posição e ajudá-lo a evitar dano à nossa amizade. E ele, como sempre, me ajudou a ajudá-lo. Mas, sinceramente, quando havia oposição (como no caso da Ancinav, que eu rejeitava terminantemente) era mais fácil conversar do que agora. É que não estou definido contra algo claro. Nem tenho argumentos (coisa que Gil logo foi me dizendo). Quando cito Andrew Keen (autor de “O culto do amador”, um panfleto contra a internet), faço-o para ver o que dizem meus amigos pró-Creative Commons sobre o livro — além de verem nele o mesmo tipo de reação que a prensa de Gutenberg provocou no seu tempo. E quando digo que acolher os pleitos dos internautas libertários é mérito do ministério Gil, façoo para ver o que me dizem meus amigos defensores da Lei do Direito Autoral existente. O fato é que ninguém diz ser contra os direitos — e ninguém diz ser contra a internet. Ou seja: ninguém quer pagar de burro. Deixar que a discussão se reduza a ciumadas de troca de turma seria uma burrice ainda maior do que qualquer dessas afirmações simplistas.
    Jacques Attali (em artigo que Hermano me enviou) argumenta que a nova lei francesa, que limita os internautas a pretexto de defender os autores, está a serviço das corporações tradicionais: as majors da música e do cinema. O jovem autor que quer ver sua criação difundida não ganha nada. E o jovem consumidor que quer ter acesso fácil a coisas difíceis também sai perdendo. Ele sugere que as fornecedoras de acesso financiassem uma licença global que forneceria a remuneração dos autores, dos intérpretes e das gravadoras criativas (ideia não muito diferente da de Kassin, à qual voltarei em breve). É texto para provocar respostas de Fernando Brant, Dubas (uma gravadora criativa) e Aldir.
    Direito torto. Um cara inventou o conceito de copyleft, em oposição a copyright (saquem o trocadilho com right — direita — e left — esquerda). Conheço de longa data. Mas volta e meia esqueço. Keen cita. Gostei de me lembrar dele agora porque muita gente pensa que é a esquerda que se opõe à troca livre na internet. Não é. Vou entregar Mautner mais uma vez: ele é que gosta de chamar os defensores do Creative Commons e similares de “comunistas cibernéticos”.
    Consegui cantar em Guadalajara. A catedral estava linda, bem na minha frente. E havia uma lua que fez da “Tonada” de Simon Días algo tão bonito quanto deve ser. Mas toquei violão tão mal, me vi tão desprovido do senso do ritmo e da harmonia, que me senti envergonhado. E havia tantos músicos bons ali, da banda de Gil e da banda de Brown. Fiquei triste. Quando minha pouca prática se expõe assim, penso em João Bosco, em Dori, em Chico Pinheiro e (outra vez) em Joyce: não me sinto no direito de estar entre essas pessoas. Agradeço e peço desculpas.
    Insisto (no papo) porque confio no que há de alto nível nas personalidades de Gil e de Ana. Ruim mesmo foi a entrevista de Emir Sader que li sobre sua entrada na Casa de Rui Barbosa. Se há uma coisa de que não gostei no governo Dilma foi a troca de Zé Almino por ele. Posso parecer suspeito, mas toda a sofisticação discreta, todo o refinamento difícil (capaz de encarar as sutis complexidades da cultura e da política) de Almino contrastam enormemente com o estilo esquerda convencional de Sader. Sou amigo de Almino (amigo no coração, pois quase nunca o vejo) e nada tenho contra a pessoa de Sader (que não conheço). Mas o que se lê em sua entrevista é um anúncio de palestras das figuras marcadas da esquerda oficial: Zizek, Marilena
    Chaui, Eduardo Galeano. Zizek é um astro pop. Amo Galeano, sua suavidade uruguaia e sua lealdade a sonhos de antigamente. Mas ler esses nomes na programação da Casa de Rui dá a sensação de empobrecimento de visão. Gosto de Marilena mas não de sua cantilena contra a mídia para absolver mensaleiros. Refrão que Sader repete na entrevista. Tou fora.

O que estou lendo

Alexandre Gama, presidente da Neogama/BBH
O presidente da agência de publicidade Neogama/BBH se dedica à leitura de "Em Alguma Parte Alguma", do maranhense Ferreira Gullar. No livro, o poeta reflete sobre a existência, a morte e outros temas. "Gullar escreve sobre o estranhamento de si mesmo, do mundo e das coisas. Mas um estranhamento que, de alguma forma, desemboca em deslumbramento", diz o publicitário sobre o autor. "Os textos e poemas extraem mágica da realidade do dia a dia e da vida. O poeta atingiu um nível de maturidade que só muitos anos de vida e conteúdo podem adicionar a quem já tem tanto talento", afirma Gama. Gullar é colunista da Folha.
EM ALGUMA PARTE ALGUMA
de Ferreira Gullar
EDITORA José Olympio
QUANTO R$ 30 (144 págs.)
GÊNERO Poesia
Do Mercado Aberto da Folha de S. Paulo

Manchetes dos jornais

ATOS & FATOS - João Castelo gasta R$ 20 mi e deixa crianças sem estudar
CORREIO DE NOTÍCIAS -  SES inicia implantação do Sistrabadorsus
GAZETA DA ILHA - Executaram o presidente na Cidade Olímpica
JORNAL EXTRA - Governo mata 30 bois e dá carne para urubus
O ESTADO DO MARANHÃO -MP investigará se reajuste de valor para IPTU é legal
O IMPARCIAL - Prisioneiros da violência