13 de mai. de 2011

Mal-estar na Cultura

    A presidente Dilma Rousseff julgou necessário sair pessoalmente em socorro da fragilizada ministra da Cultura, Ana de Hollanda, aconselhando-a a "ficar firme". O secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, chegou a dizer que "vai quebrar a cara" quem tentar desestabilizá-la.
    A contraofensiva do Planalto, dirigida como ameaça a setores do próprio PT responsáveis pela fritura da ministra, foi uma tentativa de responder ao constrangimento da véspera, em São Paulo.
    Depois de ouvir uma série de críticas à sua atuação num encontro com artistas e produtores de cultura, Ana de Hollanda deixou a Assembleia Legislativa paulista cercada por agentes, evitando jornalistas. Saiu como se fosse personagem de enredo policial, ora tapando o rosto, ora agarrando-se ao braço de um assessor.
    É difícil ignorar as evidências de que a ministra se mostrou até agora incapaz de explicitar sua agenda e de controlar os incêndios à sua volta. Insistir na vitimização, como tem feito, não ajuda muito.
    Tampouco se desconhece que o coro por sua queda tem origem em lobbies corporativos frustrados, em parte pelo corte orçamentário que atingiu a pasta, em parte pela mudança de atitude em relação à reforma da lei de direitos autorais.
    Cerca de R$ 530 milhões, num orçamento de R$ 1,86 bilhão para 2011, foram contingenciados.
O nó, porém, está nos direitos autorais. Juca Ferreira, o antecessor, enviou projeto de lei em dezembro de 2010 à Casa Civil, depois de debater a reforma em várias reuniões e submetê-la a consulta pública. A ministra anunciou que vai rever o projeto, considerado muito intervencionista, antes de enviá-lo ao Congresso.
Sua atitude foi confundida com defesa de uma legislação obsoleta (criada em 1973, reformulada em 1998), que não dá solução aos problemas surgidos com a difusão da cultura por meios digitais. Ao pé da letra, a lei criminaliza o usuário que baixa músicas ou vídeos para uso pessoal, por exemplo.
    Não é tarefa simples compatibilizar o acesso à cultura com a remuneração de criadores e empresários culturais. Preservar o direito autoral, inclusive no ambiente digital, sem transformar milhões de jovens em criminosos, mas desenvolvendo mecanismos criativos de remuneração de autores na internet -tal é o desafio vocalizado por um grupo de músicos, artistas e produtores culturais que assina o manifesto "Terceira Via para o Direito Autoral". Trata-se de um esforço de superar o impasse entre o lobby da cultura digital e o regime atual.
    O documento propõe que o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), órgão que goza hoje de péssima reputação entre artistas, seja submetido a um choque de transparência e eficiência, com a criação de uma agência autônoma para regular e fiscalizar suas atividades.
    Eis aí um caminho a ser trilhado. Ana de Hollanda ainda precisa demonstrar força e capacidade para liderar esse processo.
Da Folha de S. Paulo

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