9 de dez. de 2010

Nem fica nem sai Juca

    A questão da escolha do ministro da Cultura virou uma campanha eleitoral, espécie de terceiro turno -eventos públicos, almoços, jantares, manifestos, tuítes, blogs, Facebook, entrevistas em jornais, TVs etc. etc., uma pressão injustificável, criando um clima constrangedor e artificial para a simples nomeação de um ministro de Estado.
    Todo esse movimento de apoio orquestrado não conta com a participação da classe artística e de empresários das indústrias culturais, que estariam mais interessados na discussão de um ministério para o século 21, visando inserir o Brasil no grande fluxo das indústrias criativas, do que nessa medíocre e fisiológica questão de nomes.
    Queremos no governo Dilma um Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas antenado com o Brasil que Lula transformou em país do presente, e não mais do futuro.
    Um ministério que preserve e alimente fontes da cultura popular, artesanato, tradições culinárias, festas, folguedos e folias populares, e também voltado para a produção de bens artísticos e culturais de forma planejada e sistêmica, que leve a indústria cultural à autossustentabilidade. O vale-cultura é um mecanismo decisivo para que essa meta possa ser atingida.
    A ideia do vale-cultura surgiu no meio da comunidade artística, sendo logo adotada com grande entusiasmo pelo ministro Gil e pelo presidente Lula, que logo a transformou em projeto de lei, mas que até hoje rola em comissões no Senado Federal, dado o pouco empenho da assessoria parlamentar do Ministério da Cultura.
    O vale-cultura é a real democratização do processo cultural, uma vez que destina parte da renúncia fiscal para as mãos da população, que terá a livre escolha de ver um filme, peça de teatro, show, comprar um livro, CD ou DVD, além dos jornais e revistas que preferir.
    Subsidiando o consumo, vamos criar um mercado de bens artísticos e culturais para fruição da população, sobretudo de baixa renda, até hoje excluída do direito fundamental à informação, ao conhecimento e ao entretenimento.
    O Ministério da Cultura dos séculos 19 e 20 a que me referi anteriormente mantém o vício e a regra perversa de que a produção cultural não pode ser autônoma, tendo sempre que ficar dependente de mecanismos clientelistas mantidos pelo Estado-provedor, em vez do Estado-indutor.
    Outros fatos recentes comprovam que a intenção dos atuais dirigentes do MinC é, cada vez mais, eliminar os mecanismos automáticos de financiamento à produção.
    O pouco ou nenhum interesse explicitado em reunião recente do Conselho Superior de Cinema pelo ministro Juca Ferreira com relação à renovação do artigo 1º da Lei do Audiovisual, projeto de lei de autoria do senador Francisco Dornelles, é emblemático, ao alegar restrições da Receita Federal, cujo papel sempre foi e sempre será de evitar sangrias na receita da União.
    Mas sempre contamos com ministros da Cultura que souberam defender a importância da renúncia fiscal para a cultura, que até hoje é inferior à concedida aos free shops dos aeroportos.
    Outra lei está para ser enviada ao Congresso, ou já se encontra no Congresso, e serve para corroborar a voracidade do MinC em concentrar recursos em suas gavetas para financiar ou subsidiar a produção cultural. É o projeto de lei de reforma da Lei Rouanet que, grosso modo, trata de confiscar a renúncia fiscal concedida às empresas, que passarão, em certos casos, a devolver até 50% dela para o Fundo Nacional de Cultura.
    A questão em debate, portanto, não deve se restringir ao fica ou não fica. É ver quem quer e tem competência para liderar e implementar uma nova política cultural, abrangendo do Brasil do zabumba ao Brasil da fibra ótica.
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LUIZ CARLOS BARRETO, 82, é produtor cinematográfico. Produziu, entre outros filmes, "Lula, o Filho do Brasil", "Dona Flor e seus Dois Maridos" e "O que É Isso, Companheiro?".

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